“...disse Festo em alta voz: Estás louco,
Paulo; as muitas letras te fazem delirar”. (Atos 26:24)
Uma das coisas que mais me deixa chateado é a
falácia de afirmar que a formação do cristianismo foi feita em uma base de
pessoas ignorantes. Sabemos que isto é divulgado e aceito até entre alguns
cristãos evangélicos desinformados. Tratam os personagens da igreja primitiva como
primatas ignorantes, erro crasso este. A maior base desta ideia é alimentada
pela profissão de alguns apóstolos (pescadores), e expandida como se os
apóstolos, todos eles, fossem pescadores e que estes não tinham conhecimento.
Primeiro
erro, dentre os apóstolos existia cobrador de impostos, empresários e
conhecedores da Lei, demonstrando isto através de citações, que não eram
ignorantes. Pedro, apesar de ser considerado 'indouto', com o auxílio de Marcos
redigiu suas epístolas e em ambas mostra coerência racional (1 Pe 1:7, 2:2,
3:15; 2 Pe 1:16). Quando afirma que o evangelho não vem de fábulas, João, o
apóstolo amado, de igual modo defende a consistência existencial da fé através
da prova empírica e testemunhal (1 Jo 1:1). Judas afirma que devemos sempre
estar preparados para defender a fé que foi dada aos separados (Jd 1:3).
A
Bíblia sempre falou do ensino, da busca pela graça e também pelo conhecimento,
“Conhecereis a Verdade e a verdade vos libertará” (Jo 8:32). Conhecer é a base
da história cristã, estudar também, pois Paulo recomenda a Timóteo “persiste em
ler, exortar e ensinar” (1 Tm 4:13). E é neste personagem que quero me ater.
Fazendo uma pesquisa, mesmo que superficial, notaremos em Paulo um grande
leitor e estudioso.
Um dos
textos bíblicos que me chama atenção é Atos 26:24-26. Festo, conhecendo a Paulo
há algum tempo sabia dos hábitos corriqueiros dele na própria cadeia, inclusive
os textos de Atos 25 e 26 tratam de Paulo discorrendo sua dupla apologia em
defesa da fé (o Reino) e em defesa de si próprio como emissário desta mensagem,
pronunciamentos muito parecidos com os textos de Platão em “Apologia de
Sócrates”. Paulo conhecia a cultura grega, com certeza lia os livros dos
grandes filósofos e dramaturgos da época e/ou do império anterior ao romano,
minunciosamente pesquisava e se detinha nos livros dos profetas, achava pontos
de ligação entre a filosofia e o Evangelho do Reino. O capítulo 17 de Atos
mostra o quanto ele conhecia o estoicismo e o epicurismo, em 1 Co 15 cita o
dramaturgo grego Menandro “As más conversações corrompem os bons costumes”. O
estilo de escrita muito similar a alguns textos de Platão. A consciência do
Agnus Theos ou Agnus Dei, o Deus desconhecido, demonstra seu conhecimento da
mitologia grega. Isto só pode acontecer com alguém que estuda e lê, Paulo era
este homem.
A
Timóteo Paulo demonstra que tinha uma pequena biblioteca que gostava de
transportar, quando diz “Quando vieres, traze a capa que deixei em Trôade, em
casa de Carpo, e os livros, principalmente os de pergaminho” (2 Tm 4:13).
Então, é importante saber que os homens da Bíblia não eram ignorantes de
plantão, e Paulo, um grande estudioso e leitor, que amava a busca e a se
aprofundar não só na Palavra, mas em tudo, pois ele mesmo disse “Examinai tudo,
retende o bem” (1 Ts 5:21).
Então,
é necessário, para uma vida cristã saudável, a busca pelo conhecimento de Deus,
precisamos construir o conhecimento, este será o motor da nossa aprendizagem e
crescimento integral ao longo de nossa história em Graça.
Érick Freire
Escritor e pedagogo